lunedì, maggio 31, 2004

Incoerência

Nossa maneira habitual de fazer está em seguir os nossos impulsos instintivos para a direita ou para a esquerda, para cima ou para baixo, segundo as circunstâncias. Só pensamos no que queremos no próprio instante em que o queremos, e mudamos de vontade como muda de cor o camaleão. O que nos propomos em dado momento, mudamos em seguida e voltamos atrás, e tudo não passa de oscilação e inconstância. Não vamos, somos levados como objetos que flutuam, ora devagar, ora com violência, segundo o vento.
Cada dia nova fantasia, e movem-se as nossas paixões de acordo com o tempo.
Não somente o vento dos acontecimentos me agita conforme o rumo de onde vem, como eu mesmo me agito e perturbo em conseqüência da instabilidade da posição em que esteja. Quem se examina de perto raramente se vê duas vezes no mesmo estado. Dou à minha alma ora um aspecto, ora outro, segundo o lado para o qual me volto. Se falo de mim de diversas maneiras é porque me olho de diferentes modos. Todas as contradições em mim se deparam, no fundo como na forma. Envergonhado, insolente, casto, libidinoso, tagarela, taciturno, trabalhador, requintado, engenhoso, tolo, aborrecido, complacente, mentiroso, sincero, sábio, ignorante, liberal e avarento, e pródigo, assim me vejo de acordo com cada mudança que se opera em mim. E quem quer que se estude atentamente reconhecerá igualmente em si, e até em seu julgamento, essa mesma volubilidade, essa mesma discordância. Não posso aplicar a mim um juízo completo, sólido, sem confusão nem mistura, nem o exprimir com uma só palavra. “Distingo” é o termo mais encontradiço em meu raciocínio.


Michel de Montaigne