Galeano, mais uma vez
Não conseguia dormir. Ele havia guardado todos os sonhos juntos, numa sacola de supermercado, e a sacola tinha se aberto e os sonhos haviam escapado, e ele não conseguiu mais dormir porque não tinha nenhum sonho para sonhar.
É o que dizia. E dizia também que tinha perdido dois dias, uma segunda e uma terça, e que os procurava, desesperado, e não achava aqueles dias em lugar nenhum.
Não foi breve, a agonia. Tinha cada vez menos ar. No final, crucificado pelas sondas, só conseguiu balbuciar:
— Que ladeira comprida.
E morreu, sem encontrar os sonhos e os dias que havia tido e que tinham ido embora.
Teve pouca coisa além disso. Fernando Rodriguez nunca quis ter. Foi dono de nada, homem nu; e nu caminhou, perseguido pelas crianças e pelos loucos e pelos pássaros.
Eduardo Galeano
em As Palavras Andantes
3 Comments:
ese, adorei a casa de esquina, tu escreveu?
muito bom
abracos
steve
Gosto de Galeano, de pernas para o ar. Não conhecia este... Nem o blog, cujo autor é curiosamente parecido... Voltarei. E, permisso!, vou linkar.
adoro galeano..... principalmente palavras andantes!!! vi uma adaptação para teatro,uma vez, em porto alegre.... muito bom!
Mateus
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